20 de julho de 2007

Razão de Viver

A estrada desaparecia sem pressa sob a frente do carro. Tomás completamente embriagado pelos pensamentos permitia que, quase sozinho, o automóvel o conduzisse a casa, quase como aquele nostálgico cavalo dos filmes de cowboys que deixa o seu cavaleiro à porta sem qualquer ajuda.

No seu pensamento uma frase central:

“Não pedimos para nascer
Não mandamos no morrer
Vamos aproveitar o intervalo”

Simples, curta, directa, contudo tão complexa de implementar. Dissecando a frase começaria pelo nascer. Era verdade, ninguém pede para nascer, mas a verdade é que nascemos. Nascemos e vivemos, pelo menos alguns. Outros, apesar de nascerem, é como se não vivessem, ou vivendo, mais parecem não viver.

A questão fundamental estava em determinar o que é viver.

  • Viver é respirar?
  • Viver é comer?
  • Viver é falar?
  • Viver é andar?
  • Viver é ver?
  • Viver é ouvir?
  • Viver é pensar?
  • Viver é cheirar?
  • Viver é comunicar?
  • Viver é….?
  • Viver é….?
Afinal o que é viver?

Esta era a pergunta para a qual procurava Tomás uma resposta.

Com o Cruise Control (virtual) ligado, o carro avançada a uma velocidade constante, elevada, mas, ainda assim, ridiculamente baixa quando comparada com a velocidade do seu pensamento.

Afinal, o que verdadeiramente definiria o viver, essa era a questão.

Uma questão filosófica sem dúvida. Uma daquelas questões enfadonhas, capazes de colocar o mais feroz tubarão a dormir como um anjinho antes de conseguir abocanhar a sua presa. No entanto, mesmo as questões filosóficas podem, por vezes ter uma resposta simples.

Essa é a beleza do pensamento, do raciocínio ilógico, abstracto, irracional, incoerente com os padrões da sociedade, mas não menos verdadeiro e real. A beleza de procurar respostas onde não há perguntas, ter perguntas para as quais não há respostas lógicas e coerentes e no final perceber que, apesar do insólito das situações e dos pensamento, tudo bate certo, porque….afinal, some things are meant to be!

You can find things meant to be
If you look hard into the sea
As the waves land on the beach
I feel her eyes fixed on me
Through the wind in the trees

Mother nature she speaks
Take what she says
Let your heart do the rest

It's in the wind
It's in the trees
It's in the way you smile
At me
It's in the waves up from the sea
It's in the way you feel
When you're pleased
It's all meant to be
It's all meant to be

Your heart knows where to go
But your mind can take it slow
It's okay to rest your mind
Let your heart seek and find

It's in the wind
It's in the trees
Listen hard and you
Will see
It's in the waves up from the sea
It's in the way you feel
When you're pleased
It's all meant to be
It's all meant to be
These are things just meant to be
These are things like you and me

It's all meant to be
It's all meant to be

These are things just meant to be
These are things like you and me
Mother nature sings and breathes:


No final viver é algo tão simples. Viver é sentir. Viver é olhar, tocar, ouvir, cheirar, saborear. Viver é sentir emoções, é desejar, é dar e receber, viver é recordar, viver é chorar, viver é sentir falta, viver é amar. Tomás tinha consciência que sempre o soube, mas que, por algum capricho da natureza, morrera antes de viver.

Na verdade quantas pessoas acordam todos os dias mortos, afogados em problemas, em desgostos, em responsabilidades, afundados sob milhares de milhões de grãos de areia, de pó, que se acumulam dia após dia nas suas vidas impedindo-os de viver. Até que, um dia, inesperadamente, sem aviso prévio, uma onda de mar, de braços abertos varre a areia que durante anos se acumulou sobre as suas vidas e, sem mais, voltam a viver.

Tomás adorava viver, era um verdadeiro apaixonado pela vida, pelo cheiro, pelo toque, pelo olhar, por escutar, por rir, por saborear, por beijar, por amar, ainda que a maior parte do tempo permanecesse sepultado por toneladas de areia e grão de pó. Só uma força extraordinária, um oceano de vida poderia varrer tanta areia e colocar à vista a luz do farol, a luz que se estende pelos oceanos da vida para nos guiar a um porto seguro.

Se aquilo que sentia era, ou não, um intervalo entre duas tempestades de areia pouco lhe interessava naquele momento, o que sinceramente lhe interessava é que vivia e recordava com intensidade os momentos juntos, encaixados um no outro, o toque, as carícias, os beijos, os sorrisos, o olhar meigo, o cheiro, o sabor dos seus lábios, e mais, muito mais. Passava-lhe tudo pela frente, como a vida passa aos olhos de um condenado, neste caso, não à morte, mas sim à vida.

Pegou no telemóvel e marcou os números. Esperou que os intermináveis pis terminassem para anunciarem uma presença do outro lado.

Uma voz suave e meiga surgiu do outro lado.

- Olá! disse ela.

- Olá! Eu sei que ainda estivemos juntos, mas fica sempre tanto por te dizer…

- Eu sei – disse ela. – Isso é também o que sempre sinto.

- Tenho algo de importante que gostaria de te dizer – continuou ele. – Pensava na questão que nunca me colocaste, mas para a qual julgo ter uma resposta.

- De que falas?

- De nade em especial – brincou ele – e de tudo. Há algo muito pequeno que que gostaria de te dizer. É importante que to diga.

- Então diz!

- Sabes...- soluçava ele - …que hoje descobri que vivo. Agora sei que vivo. Sei que vivo porque me fazes viver.

- Queria agradecer-te…, dizer-te obrigado, bem…o que te queria dizer é que…

- …Obrigado por me devolveres à vida!



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