13 de dezembro de 2004

O Encontro (Parte V)

Sentia-se que era uma chamada importante. Não foi muito demorada, mas foi bastante intensa. A decisão que a sua passageira acabara de tomar transtornava a vida de outras pessoas. O ambiente no táxi tornou-se denso durante os instantes que ela falou ao telemóvel.

Isto contava o Sr. Diogo aos seus colegas taxistas no habitual falatório de fim de dia. Continuou:

- Se vocês a vissem… Bastante atractiva e com um olhar capaz de matar de amor um homem. No entanto havia algo que a perturbava, pois após o telefonema, pediu-me para mudar de direcção para a levar ao local onde a tinha apanhado, ao pé da livraria do "Resende", em frente à leitaria "Nacional". Dei a volta e lá segui em direcção ao "Resende", mas quando nos estávamos a aproximar disse-me para não parar e deu-me uma nova morada.

- Ai Diogo quer-me parecer que tens uma admiradora dos teus dotes de motorista…

Após esta tirada de Francisco, todos os colegas riram com vontade, só de olhar para a cara do Diogo, que rapidamente se dispôs a responder.

- Não brinquem amigos. Ela parecia algo confusa. Nem reparou em mim. Enquanto eu conduzia pelo trânsito infernal, ela não descolou os olhos do livro que lia dedicadamente. Eu é que não conseguia descolar o olhar do espelho retrovisor, nem quando em consequência da minha apetência para a visão à retaguarda ia embatendo na traseira de um autocarro, ela tirou os olhos do livro.

- Isso não deveria ser um livro, deveria antes ser uma dessas revistas de imagens das festarolas dos “ranhosos”. Tu é que estavas com tanta atenção nas pernas da tua passageira que acabaste a confundir a “Trombinhas do Nova Gente Vipi” com um livro…

Esta última interrupção do António provocou mais uma gargalhada geral.

- Não me gozes António. Na verdade que até nem importava que uma mulher daquelas olha-se para mim, pelo menos uma vez, mas não tenho essa sorte, mas acreditem que ainda sei distinguir um livro de uma revista. Ainda vos digo mais, depois de muitos anos a olhar pelo retrovisor e a ler as gordas dos jornais dos passageiros através deste, desenvolvi a capacidade de ler ao contrário. Para aqueles que quiserem saber algo mais sobre o livro podem ir compra-lo.

Dizendo isto Diogo levantou-se a foi até ao carro onde apanhou um livro que atirou para cima da mesa, à volta da qual estavam reunidos os seus colegas. Na capa podia ler-se o título “Histórias de um Faroleiro”.

O espanto dos seus colegas foi geral, afinal ela tinha-o impressionado de tal forma que Diogo fora comprar o livro.

Alberto, com os olhos pregados no livro que repousava sobre a mesa, articulou hesitante um comentário:

- Ó Diogo não te sabia apreciador... mas ... tu ... foste comprar um livro?

- Deve ter imagens… Mas agora até eu estou curioso por saber onde levaste tu essa “deusa” – apressou-se a dizer Francisco já refeito do choque.

Sentando-se vagarosamente na cadeira, Diogo olhou os colegas nos olhos, um a um e disse.

- Meus amigos, hoje aconteceu-me a mim, mas amanhã pode acontecer-vos a vós. O importante é nunca perder de vista o céu estrelado, pois as estrelas cadentes, que dão vida aos sonhos, raramente anunciam a sua chegada.



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