8 de fevereiro de 2006

A Espera da Felicidade

Acordara pensativo, meditativo, melancólico, sentenciariam alguns. Queria fervorosamente encontrar uma razão para aquele estado de apatia compulsivamente frenética. Era algo difícil de explicar, o que sentia naquele momento. Entre a aparente apatia que transparecia no seu exterior calmo e ausente, e a agitação e desordem que reinava no seu interior, sobressaia a busca vã por uma explicação que não iria encontrar, simplesmente porque ela nunca esteve escondida.

Bem pelo contrário, a explicação permanecia colada na retina dos seus olhos, na ponta dos seus dedos, na superfície dos seus lábios, no topo das suas células olfactivas. Tudo, mesmo nada, lhe lembrava a sua figura, o seu rosto, o seu cabelo, a delicadeza dos seus gestos quando, delicadamente, e com meiguice o afagara em seu regaço.

De um pulo sentou-se na extremidade da cama, havia que combater aquela aparente apatia. Energicamente trauteio uma canção e tratou de retocar o seu indefinível aspecto exterior. Tomou o pequeno-almoço, vestiu uma camisola de lã e preparou-se para o seu passeio matinal.

A manhã estava fria; comprovou ao abrir a porta. Puxou o fecho do impermeável e preparou-se para absorver, com o mesmo fervor que impelia a sua melancolia exterior, o ar húmido carregado de maresia da manhã. Deitou a mão ao telemóvel à procura de um doce, ainda que light, muito light, mas nada. Ela partira, esquecera-o. Ele já o tinha previsto, até já lho tinha dito, embora ela sempre menospreza-se o seu aviso.

Recolocou o telemóvel no bolso enquanto a sua mente filosofava sobre a angústia da ausência, a ausência na presença, a falta do que lhe fazia falta mesmo sem saber que lhe fazia falta, sem perceber quando começou a sentir falta.

“PORRA!”, gritou muda a sua mente. Que pensamentos aqueles!

Concentrou-se na sua caminhada e no mar que o envolvia com uma serenidade ímpar e inacreditável, para uma manhã de pleno Inverno. Mas era necessário assegurar o equilibro do universo, e aquele mar assim, calmo, certamente representava o contraponto do seu espírito, da agitação do mar de sentimentos, da ansiedade reprimida no seu interior.

Mas que poderia fazer, essa era a verdadeira questão. Lembrava como em pequeno alguém lhe ensinara algo sobre os pássaros livres. A sua liberdade era o seu maior bem, ainda que nem sempre tivessem consciência disso e só havia duas formas de os prender.

A primeira seria cortar-lhe as asas. Algo muito doloroso e cruel, demasiado atroz e que só um desalmado alguma vez tentaria. A outra era que… bem essa… embora aparentemente não tão má, não deixava de ser dolorosa, principalmente em momentos de coagida ausência.

Aquela sabedoria que há muitos anos lhe tinha sido ofertada pelas mãos do tempo, esse idoso e sábio conhecedor de aves, mostrara-lhe que não havia forma doce, delicada e ausente de amargura de prender um passarinho. Havia que o deixar voar, voar livre de fronteiras pois era assim o seu céu, de um azul imenso e sem outras barreiras que não o cansaço que lhe provoca o próprio voo.

Contudo, deixar-lhe-ia um pouso, uma casinha pendurada na árvore do jardim, onde todos os dias colocaria comida e água, na esperança que, algum dia, a delicada ave decidisse descansar ali. Até esse dia teria de, continuamente, lutar contra o martírio da espera, um suplício ao qual o seu endurecido espírito procurava incessantemente permanecer insensível, concentrando toda a sua força na esperança desse dia, em que poderia finalmente dizer que…

...era feliz.



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