15 de agosto de 2004

A Partida

Chegara a hora de partir!

De frente para o farol, sentiu a maresia tocar-lhe os olhos, que lenta e progressivamente ficavam cheios de água salgada, que se desprendia num choro mudo, seguindo o curso imposto pelas linhas marcadas no seu rosto dorido.

Eram sempre assim as despedidas, tristes, com sabor a sal. Mas há coisas que são inevitáveis, por maior que essa não seja a vontade. A vontade era de ficar mais um ano, um mês, uma semana, um dia, uma hora, um minuto, um segundo que fosse.

Um segundo, mais um segundo, parece tão pouco. É tão pouco, não é?

Mas comecem a juntar segundos e vejam o que conseguem. Cada segundo guarda em si aquele instante mágico, aquele último toque, um último gesto, olhar, beijo, palavra ou mensagem. Pensem em quantos "últimos" segundos tiveram nas vossas vidas e como eles vos marcaram.

É assim a vida, um amontoado de segundos, todos importantes, mas alguns mais vivos que outros na memória, ou na pele.

Pensava agora na chave que rodava pesada e morosa ao fechar a porta do farol, na luz apagada, em quantos marinheiros ficariam presos na escuridão sem a luz do farol. Pensava também na sua Sereia, aquela que do mar olhava o farol à procura de um sinal, uma luzinha, um sonho, uma promessa de um porto seguro.

Mas não havia volta a dar-lhe, eram as férias, elas que se estenderiam por vários dias, muitos, demasiados...

Colou o aviso na porta do Farol:

FAROL APAGADO
MOTIVO: FÉRIAS DO FAROLEIRO

e afastou-se, pesarosamente do seu farol.

Talvez depois da férias regresse.

Talvez, talvez…



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