19 de setembro de 2004

O Arrepio

Sentiu as palavras crescerem, crescerem e multiplicarem-se, amamentadas por um turbilhão de sentimentos. Amassados formavam um composto explosivo e perigoso, que pouco a pouco fugia da sua cabeça, com a força de uma onda gigantesca, um verdadeiro tsunami, que lhe invadia a corrente sanguínea.

Esta mescla foi lentamente percorrendo as suas veias e artérias carimbando a sua passagem com um arrepio que se alonga de uma extremidade do corpo à outra. Aquele era um arrepio quente, ou talvez docemente frio, de uma doçura que parecia quente.

Não o queria, mas não tinha escolha, aquele veneno dominava já o seu corpo e sentado à janela que lhe abria as portas do mar, sonhava, sonhava em câmara lenta, tão lenta que cada imagem, cada rosto, cada palavra, gesto, olhar e sorriso parecia não ter fim, só aquele arrepio, um arrepio frio que o aquecia mais e mais, mais do que alguma vez tinha desejado, continuava a usurpar e a apossar-se do seu íntimo a uma velocidade vertiginosa e inadmissível.

Tinha de procurar um antídoto, um unguento, um comprimido milagroso, um anti-arrepios que o livrasse daquela dor. A dor de uma saudade ausente, de um gostar e não querer, de um não ter e mesmo assim... perder.

Então, como uma brisa, um sopro libertador, que alivia o calor e aquece o ambiente frio, ela aproximou-se, silenciosa, invisível, protegida do seu olhar triste. Colocou-lhe os braços à volta do pescoço e disse-lhe ao ouvido:

- Olá! Aposto que já não me esperavas...



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