Recordação
Chegara invariavelmente atrasado. Não excessivamente, apenas o indispensável para não ser o primeiro, nem o último. Não era seu apanágio ser inoportuno nem espalhafatoso nas entradas, mas a nova filosofia mais liberta, estava definitivamente a influenciar esta nova atitude despreocupada em relação à vida que corre apática aos nossos atrasos, desejos ou medos.
Ela tinha sido a sua anfitriã e agora recordava.
Recordava o seu sorriso quando lhe disse "- Bom-dia", o brilho nos olhos, jovens, levemente cândidos.
Recordava os beijos formais trocados.
Recordava as indicações, claras, simples e precisas que lhe tinha prestado.
Recordava a silhueta de mulher que se escondia sob o manto daquela roupa formal. Os sapatos, pretos, de camurça, o salto invulgarmente alto, as longas calças pretas a refrescar a imaginação com banhos de imagens das pernas que delicadamente resguardavam.
Recordava ainda a forma como balouçava o leve tecido das calças, justas ao cimo, mas largas ao fundo, acariciando a cada passo a doce e cálida pele que tão sublimemente abrigava dos olhares indiscretos.
Recordava a camisola branca, de manga curta, cuja cor contrastava e realçava o tom levemente acastanhado dos seus braços, sinal da perfeita comunhão com o sol de verão.
Recordava a delgada cintura que apertava o olhar em direcção ao discreto e opaco soutien branco sem alças, que com decoro, vigiava discretamente os pensamento mais ousados sobre que maravilhas naturais esconderia, e assanhava sentimentos marcadamente masculinos.
Recordava o cabelo, liso com um risco levemente deslocado à esquerda e forma natural como o prendia atrás das orelhas, procurando camuflar a beleza dos ombros suavemente visíveis sob o generoso decote.
Recordava agora os brincos, duas argolas pequenas, do tamanho de um anel generoso, estilizadas em ouro. Recordava até a pulseira, humilde, sinal de um juventude em progressão para a recta final.
Recordava o leve toque de base e o batôn que desesperadamente tentavam ampliar o brilho de uma beleza que no seu jovem vigor era impossível melhorar.
Recordava o conjunto, o olhar, o sorriso e aquele sinal na face esquerda, pequeno, quase imperceptível, mas ardilosamente intrigante quando pedia para ser beijado.
Recordo isto tudo, recordo-te a ti!
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